Flirts


 

A sua situação inspirava qualquer coisa de romance de Nabokov. Por puro acaso encontrara-se com um amigo de adolescência e no meio da calorosa conversa este tinha-lhe contado sobre as suas peripécias amorosas. Que a última namorada que tivera tinha menos dez anos do que ele e que namorava atualmente com uma que tinha mais dez anos do que ele. Segundo o próprio o primeiro namoro tinha corrido mal pela falta de maturidade da ex-companheira, e o segundo, o atual, lá ia de vento em pompa, de tal maneira que já planeava emigrar com esta. À luz dos recentes acontecimentos Robert não podia deixar de sorrir ao pensar na surpreendente ironia das coisas. Ao contrário do seu amigo tinha namorado uma mulher dez anos mais velha do que ele e estava prestes a namorar uma rapariga dez anos mais nova do que ele. A primeira fora um desastre em termos amorosos e a segunda estava prestes a seguir, por razões diametralmente opostas, o mesmo caminho. No seu interior o conflito entre o seu desejo sexual e a voz da razão era muito intenso, verdadeiramente dilacerante. A miúda estimulava-o sobremaneira. E doentiamente masturbava-se a pensar nela, no seu imaginado corpo franzino mas teso, de seios breves mas rijos, e vulva imaculada e rosa, a pele nívea e levemente pastosa como o leite e visceralmente lasciva, desejosa. Medley de seu nome. E simultaneamente que imaginava o que poderia ser este mirífico e até utópico coito não conseguia deixar de ser perseguido pela sombra da corrupção. Pela corrupção que o seu relacionamento com uma mulher dez anos mais nova que ele, quase uma adolescente, provocaria na sua personalidade moral, no seu caráter, e, principalmente, que consequências teria na vida da miúda. Quanto mais a contactava, quanto mais tempo permanecia perto dela, mais lhe queria tocar, e, por outro lado, maior era a consciência que ela lhe era intocável, interdita. Aberta essa porta e estragaria a sua vida, e, principalmente, a vida da divina Medley. Mas o que poderia fazer se ela se atirasse a seus braços? Repudiá-la-ia? E o sofrimento que a rejeição não provocaria naquela pobre alma inocente que estava prestes a cometer a imprudência de o amar ou, pelo menos, de o desejar? O problema é que do outro lado deste dilema, deste violento e carnal diálogo interno, estava nada menos do que a conspurcação que a sua mente pervertida, a sua manha, teria sobre uma jovem que tinha todas as condições para uma vida feliz, uma vida inteira pela frente. Sucumbiria Robert ao mais rotundo e primário dos egoísmos ou seria adulto o suficiente para rejeitar tal caminho? Os genitais diziam-lhe uma coisa e a razão outra… Pela experiência que tivera com a sua ex-namorada dez anos mais velha antevia que a sua relação com a namorada dez anos mais nova se degradaria pelas mesmíssimas razões que a primeira. E, nesse caso, como o foi para à ex-amante Robert, quem iria sofrer era ele. Depois, para além do sexo, que razões fortes partilhariam para solidificarem uma relação? Ele um pedante amante das artes e diletante ressabiado, e ela uma pequena e aparentemente delicada flor, uma ninfa, que ouvia música pop e passava longas horas ao telemóvel a falar com as outras ninfas como ela, a fazer voluptuosos comentários sobre os rapazes e a falar de Robert sem nunca o mencionar apesar de fazer questão de deixar entender que era sobre ele que falava. Como poderia afinal Robert, um solteirão quase na casa dos quarenta, sobreviver intato àquele círculo de jovens sedentas e conspirativas que facilmente o arrastariam, por meio das artes da sedução e das correspondentes provocações, para um beco sem saída de humilhação pública e de gozo. Sentia-se como um boneco e um idiota. 

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