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A mostrar mensagens de setembro, 2023

Síndrome Peter Pan

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  Sentia que não crescia, ou que crescia, mas sempre com um atraso, um delay , como lhe fosse impossível vencer a distância entre a sua idade real e a sua real maturidade. Sim, do que se tratava era basicamente de expetativas. Robert sentia que não era tão adulto quanto aquilo que as pessoas esperavam de si para a idade que tinha. E compreende-se. Via os outros, os da sua geração, com a vida praticamente resolvida, um emprego sério, expetativas de vida sérias, um relacionamento sério, filhos ou filhas sérios, empréstimo de casa sério, tudo sério. E ele, ele ainda apanhava carraspanas arrastando-se pelas ruas mais sórdidas até de madrugada, levava no cu, trabalhava como caixa num supermercado, não tinha filhos, recebia o salário mínimo, não tinha expetativas nenhumas, nem sabia onde se via daqui a três meses, quanto mais daqui a três anos. Não tinha crescido; ainda idealizava o mundo de uma certa maneira e permitia-se a ter sonhos. E já se sabe como são os sonhos desviam-nos a atenção d

“Logo à noite conversamos”

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  “Logo à noite conversamos”. Era a frase que bastava, proferida com todo o dramatismo de uma ameaça, para Robert, criança, passar o dia inteiro em sobressalto, temendo a tempestade que ao final do dia, irrompendo mansamente pela porta até se abater sobre a sua pessoa numa fúria desenfreada de raios e bátegas, infligiria sobre o seu corpo terríveis penas e suplícios. Bastava que a mãe, Medley, pronunciasse esta frase-modelo para que no espírito de Robert o resto do dia ficasse irremediavelmente congelado e perdido. E Robert sabia sempre ao que a mãe se referia; a merda que tinha feito. Bastava que a mãe proferisse tal ameaça para Robert começar a punir-se, a rogar a Deus para que o castigo não lhe fosse pesado, a dar mostras de arrependimento e dar azo ao remorso – mesmo que a sua má-conduta fosse perfeitamente coincidente com as coisas de meninice. E quando a hora da mãe chegar a casa se aproximava agudizando toda a tensão e dramatismo da situação Robert ficava ainda mais paralisado
Trazias aquele ar desolado Para quem a vitória traz o amargo sabor da derrota E larga as armas à soleira da porta De quem só uma ínfima parte obtém  De tudo o que lhe fora prometido E não menos do que o mundo Ou de quem regressa de uma viagem grandiosa Repleta de aventuras inusitadas e dignas de registo Descoberta de espécies jamais catalogadas E convivência com povos de línguas estranhas  Pronomes impronunciáveis Costumes excêntricos e até imorais Sem que isso te livre da sensação de desânimo E da besta mortífera da insatisfação Essa pedra no sapato macerando a carne E da qual por mais que sacudas não te livras Do chamamento encantado do desejo Parece que chegaste aos confins  E na verdade pouco ou nada avançaste Ainda que tendo percorrido a Terra inteira Lido mais livros do que muitas bibliotecas do mundo E vivido mais paixões arrebatadoras do que tantos sedutores O mundo é demasiado colossal e cruel Não para o nosso desejo e sonho que sempre são ilimitados  Mas para o tamanho das no

As democracias realmente existentes

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A democracia liberal, a democracia realmente existente, é uma forma de legitimação do poder e do monopólio no uso da violência. Esta divisão do poder no seio da sociedade que se torna inadmissível para os democratas numa ditadura é tornada legítima na democracia liberal. É como se sufragássemos os nossos algozes. Não será então por acaso essa divisão entre a democracia na esfera pública (garantida, dentro de limites e contradições que são também os limites e contradições dos interesses da burguesia, pelo Estado de direito com a sua pluralidade de direitos civis) e a ditadura na esfera privada ou entre a democracia na esfera da superestrutura e a ditadura na esfera da produção. A democracia realmente existente não é um modo de vida inseparável de todas as dimensões da vida social (desde a esfera privada do lar até à economia), mas uma forma de regime que pretende legitimar uma divisão dita necessária através da instituição temporária do voto, de um sistema de freios e contrapesos ( c
  É difícil perceber se é literatura Mas que é bonito lá isso… É na verdade um canto inominável Intraduzível em qualquer língua do mundo E no entanto sabemos muito bem que é real Que nos cola às entranhas como pastilha ao estômago Que nos despedaça e nos confronta O que é afinal percebermos aquilo que dizemos perceber Quando as palavras principiam a perder a aderência E então se tornam flutuantes Indomesticáveis e vacilantes Elas mesmas indecisas como a mão que escreve Ou a voz que soletra Estamos aqui como a poesia No limiar da linguagem Um pouco mais de insistência Isto é de insanidade E a fina parede rompe qual placenta E é então que inomináveis e indescritíveis paisagens Assomarão diante do nosso espanto Que abismos e silêncios nessa finisterra Que poemas inauditos, belos de doer, irrepresentáveis, Figurarão no limite dos poemas Vivemos no interior das palavras Como as larvas no seu casulo Quem sabe se um dia não possamos ser também

A louca dos gatos

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  Medley era também uma “doida dos gatos”. Alimentava-os, albergava-os, às dezenas, principalmente sofria por eles, tanto ou mais quanto sofria por Robert ou por ela mesma. Era daquelas fanáticas que tirariam o pão da boca para dar a um gato esfaimado sem pensar duas vezes. Robert não podia compreender tamanha devoção que mensalmente lhe delapidava a algibeira. Também havia cães e andorinhas que faziam ninho na primavera, mas estas não eram por Medley alimentadas, andavam à deriva, faziam o seu próprio caminho. Robert também gostava dos animais. E queria vê-los bem, e brincava sempre com eles e fazia-lhes festas. À sua maneira também os amava e os animais também gostavam muito dele pois os cães abanavam a cauda ao portão para o receber e os gatos ladeavam-no ajeitando-se de modo a obterem afagos ou nas suas pernas se esfregarem. Ronronavam também. Mas eram demasiados. E cagavam tudo lá em casa e mijavam nas esquinas das paredes, e a casa andava sempre empestada do fedor a dejetos e
  A solidão mais absoluta Espera-nos no final da noite E por agora só se vê o brilho letal dos seus olhos E a brasa incandescente do seu cigarro Ao fundo no dobrar da esquina Nesta sociedade de bárbaros que tanto desprezam os seus velhos Esses mortos-vivos de peles caídas, doenças várias e aspeto grotesco Que se arrastam pelas sombras da cidade Os nossos incómodos inquilinos invisíveis E já podemos adivinhar entre a neblina as silhuetas Dos que entretanto inevitavelmente partirão Primeiro de todos os nossos pais Depois os nossos colegas de trabalho, os vizinhos, Os melhores amigos Os próprios filhos se os tivermos Banquetes do primeiro dos deuses Cronos que tudo devora Até só restarmos nós connosco mesmo Segurando talvez uma caveira Ou entabulando longas e severas discussões Com os nossos fantasmas Alimentando de larvas os remorsos Perpetuamente obcecados com a nossa galeria de arrependimentos Com sorte teremos quem nos acompanhe E faça par
Não sabemos nada sobre aquilo que ainda não descobrimos (dirão que é natural que assim seja) Mas sabemos tudo sobre o quanto nos apavora E nos põe em causa, e nos desnuda E desmistifica Vivemos apenas uma sombra de tudo o quanto Podemos ainda vir a saber Essas inconfessáveis revelações do espírito do progresso Trespassados apenas por clarões súbitos de sobriedade E relâmpagos de lucidez Confrontados com a lâmina severa da finitude, o seu vértice, Ou a força abruta do nosso caráter visceralmente ridículo Não temos ainda tempo para nos rirmos Somos diariamente confrontados com a possibilidade De uma outra vida por detrás dos muros desta, De todos os seus cenários de papel e peças trágico-cómicas, Compreendemos perfeitamente a razão de ser das ruínas Da impossibilidade de construirmos algo verdadeiramente estável E duradouro Que surpresas a ciências nos reservará, ou a magia negra, Ou a noturna alquimia das artes Apenas podemos saber que paulatina

O comunismo como reino da igualdade e da liberdade

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Como comunidade esquecemo-nos de como é viver num tempo sem Estado. E é portanto natural que esse tempo se apresente ao nosso imaginário, muitas vezes em simultâneo, sob o signo do tempo mitológico, do tempo bárbaro da guerra de todos contra todos ou do tempo irremediavelmente atrasado (atrasado para a civilização) das comunidades primitivas. Mas a persistência deste esquecimento revela um lapso ainda maior, ainda mais profundo, um lapso digamos ontológico (relacionado ao ser das sociedades): é que não conseguimos pensar, no presente e para o futuro (mesmo que sob a forma da utopia), uma sociedade sem Estado. E, no entanto, é esse apelo político que subjaz à mitologia comunista. O paradoxo do designado socialismo real – ou do socialismo que se pretende materializar politicamente através da máquina do Estado – é procurar fundar a sociedade dos produtores livres e iguais por via do Estado, procurando assim produzir a igualdade e liberdade por meio da reprodução da desigualdade e

O temor proletário à revolução

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Queremos a revolução mas simultaneamente vivemos aterrados por ela, pela sua mera hipótese, a sua iminência e imanência. Como proletários, ou, pelo menos, como partidários da causa comunista, não tememos burguesamente a revolução proletária no que ela carrega de promessa de alteração revolucionária das relações de produção, e, por encadeamento, da abolição da propriedade privada e das classes. Tememos a revolução, ou temos-lhe a maior cautela, por pavor da sua perversão estalinista . O que no fundo significa temor pela estatização total da revolução. Até porque já não nos recordamos como é viver sem Estado, sem divisão estrutural da sociedade; o que representa na verdade um viver a essência do comunismo ou, vá lá, o seu fim. Se a burguesia teme a revolução por ela colidir diretamente com os seus interesses de classe, o temor da revolução por parte do proletariado é outro. A apreensão sentimental e racional à revolução por parte das camadas populares e produtivas mais progressistas n
Não sei o que se passa com as pessoas Elas deixaram de agredir os outros Para se passarem a agredir a elas próprias Ou além de agredirem os outros Agridem-se a elas também E congratulam-se por falharem Porque falhar faz parte do percurso Mas qual percurso? O percurso que todos os dias as leva a falhar E encolerizam-se, e choram, e desesperam, Por aquilo que acham que as vai fazer felizes E chegam ao fim do dia e percebem que Uma e outra vez Foram enganadas E parece que não sabem fazer mais nada Do que empanturrar o focinho de cerveja Ou encherem-se de livros e de teatro Ou viverem obcecadas com aquilo com que forram o estômago Ou queimarem os pulmões com o fumo denso das substâncias proibidas Não sei o que se passa com as pessoas Que preferem confidenciar-se junto dos seus animais domésticos Do que dedicar um minuto de atenção Aos vizinhos que as cercam E têm o universo inteiro à sua disposição Mas preferem gastar o seu escasso e mísero t

Do modo como nos tornamos insuportáveis

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Gostava muito de Medley mas por vezes não a conseguia suportar. Medley era demasiado intensa para ele. Sugava-lhe toda a energia, secava-o. Com Medley por perto tudo girava à volta dela; e mesmo que estivesse longe! Incessantemente lhe mandava mensagens, não o largava, queria aprofundar os temas, levar ao limite qualquer conversa. Na verdade queria falar sobre si, ouvir como era brilhante, que a adulassem descaradamente, que lhe mentissem enfim. Chegava a ser exaustivo conviver com Medley, tanto que Robert frequentemente interrompia uma conversa a meio – que na verdade era mais um longo e enfadonho monólogo da sua namorada – para ir fumar um cigarro à varanda ou justificando-se com um compromisso inadiável, uma panela a arder na cozinha, uma necessidade fisiológica. Estava farto dela, do seu egocentrismo, da sua necessidade patológica de atenção e de validação, mas não conseguia romper com ela por esse motivo. Como podia confessar-lhe, depois de tantos anos, que simplesmente não supo
Sim, humilhaste-te Degradaste a tua dignidade Por um ou dois pequenos favores do ministério Pediste emprestado a quem não devias Enquanto imprudentemente te justificavas Com adversidades e relatos neorrealistas de pauperização Foste até onde não te era permitido Para ouvires mais um redondo não no semblante em queda Em súplica Mas o que é que tudo isso importa? Toda essa vergonha perpétua, essa decadência e aviltamento O tempo é como as águas da tempestade Que tudo arrastam à sua passagem   E no seu curso lavam também o sangue e apaziguam os remorsos Esses aguilhões alegremente se contorcendo na carne Como se dançassem Poucas são as verdades que resistem à voracidade do tempo Tudo acaba por sarar e ser esquecido Exceto, claro, o mesmo ódio de sempre E uma inimizade brutal que atravessa a muralha dos séculos.

Bolas de berlim

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Voltava a descer a ladeira em calçada portuguesa em direção à pastelaria. Era manhã de Domingo, talvez primavera ou outono, e a mãe, gulosa e a desfalecer de fome, lembrava-se em boa hora de o mandar ir buscar duas bolas de berlim. Como era pequeno e frágil e simultaneamente de uma vivacidade capaz de revolver qualquer muro ou escolho! Robert quase não se via com a testa à altura do balcão. Mas as empregadas já o conheciam e saudavam-no com ternura. “São duas bolas de berlim, por favor!”, dizia Robert com aquela voz de garoto. Trazia talvez uma camisola azul ligeiramente desbotada, umas calças de ganga sujas nos joelhos, uns sapatos achatados e rotos pelo uso. A pobreza entranhava-se na sua fisionomia esquálida e escorria pelo nariz em derrame. Assoava-se com as mãos. As empregadas, com o seu instinto maternal, perguntavam onde estava a mãe ao que Robert respondia sem embaraço que estava em casa, a descansar, na cama. As funcionárias entreolhavam-se num misto de perplexidade e resign
  Em Delfos me ordenaste Nessa voz simultaneamente doce e assertiva de oráculo Que eu me conhecesse a mim mesmo Mas como posso eu conhecer-me a mim mesmo Quando não passo de um amontoado de ficções Das mentiras que incessantemente me conto E me contam sobre mim mesmo Quando nada existe no meu interior Não sendo uma multidão ordenada de órgãos Em suave e lenta decomposição Um exército venoso em marcha E carne latejante e nervos como cordas que tangem Num emaranhado de destroços em vasos comunicantes.   É um quase nada que separa o meu corpo do resto do mundo Um limiar E é ver como ele se confunde, se dilui e se dissolve Na seiva das plantas, na respiração celular dos atros, No ritmo melancólico das chuvas que fecundam a terra Exalando o fedor acre a sangue e sexo.   Pudesse eu por um instante que fosse Ver-me por fora e por dentro A partir de um ponto completamente outro Distante e frio E talvez implodisse.   Condenados a este corpo
É comovente o teu ar de desastre De virgem decepada A forma como uma e outra vez te atiras de cabeça Ao fracasso a que sempre te condenas Talvez gostes genuinamente de viver assim Talvez não saibas fazer de outra maneira E é delicioso assistir ao modo como colapsas Como voluntariamente te precipitas E te afundas.   Do fundo do abismo me rio E é pelo eco da minha voz que me procuras.
 Concordarás ao menos que ardemos Que os deuses nos prenderam  À pira do esquecimento E é tudo tão fugaz quanto intenso  Para não deixarmos atrás de nós  Mas também em nosso redor  Um rasto de indelével ruído De caos e de amores fúteis  Um lastro de ruínas com a sua coleção de ossos incrustados  Concordarás que são demasiados os fantasmas  Os espinhos na carne Para que nos continuemos a levantar como se nada fosse Dia após dia Alimentas o gigantesco e delirante mito De que podemos ser algo mais  Do que o selo da extinção cravado no seio do nosso olhar apavorado  E delator. 
 O dia pode ser violento  Trazer com ele adagas e corsários,  Salteadores dos sonhos que alimentam a vida  E toda a espécie de delinquentes,   Irromper a guerra civil no seio da mais aparente paz quotidiana Infestar a cidade de todo o tipo de explosivos Carregar consigo a tempestade prenhe de raiva e vingança  Tingir a neblina de escarlate  Ser intempestivo como um deus irado Ou impecável como o anjo da morte É difícil livrarmo-nos deste paladar a sangue,  Que ainda borbulha e ferve nos nossos lábios,  Deste escancarado prazer,  E fechar as cortinas ao dia celebrando ou esquecendo  O pútrido olor da noite. A verdade é que todos sabemos como os dias começam Mas não podemos saber como irão acabar.  E a madrugada é uma infinda e lívida paisagem de destroços.
 É natural que te ame Quando deténs todos os atributos do mundo  Uma ferocidade de viver capaz de arrancar pela raiz  O mais obstinado dos conformismos,  A recusa férrea da fatalidade,  De sacudir os ombros dos que vivem E pensam, e agem,  Como se já estivessem mortos  Esses milhões de milhões de fantasmas Que tomam conta dos corpos da multidão ininterrupta e fervilhante  É natural que te ame Quando és abnegação incondicional Pura dádiva alheia a toda a reciprocidade  Quando arrastas no teu movimento  Toda a dramaturgia do universo  Com a sua explosão de estrelas  O apetite voraz e humanamente incalculável dos buracos negros E as suas partículas subatómicas absolutamente imprevisíveis  É natural que te ame meu amor Quando te confundes e te mesclas Com este barro que tudo torna único e singular,  Evanescência integral e poder sem objeto ou finalidade É natural que te ame sem que possa responder à incomensurabilidade do teu amor  Por tudo.

A sociedade e o seu culto do génio

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  Vivemos numa sociedade que valoriza o talento individual, presta culto ao génio e é obcecada pelo prestígio. Por esta ordem de razões se compreende que as classes mais eruditas se escandalizem com quem recuse sobrevalorizar o cânone, que o critique, o rebata e conteste; e as classes leigas tendam para a veneração dos ídolos muitas vezes validados pelas classes letradas. Assim se justificando também a banalização de epítetos como “génio” e de superlativos como “brilhante”. É claro que estes exemplos pretendem representar “tendências” e não casos individuais que lhes são honrosas exceções. À perda histórica da aura que Walter Benjamin viu ascender e vingar com a reprodução mecânica da cópia não se seguiu uma proporcional queda do culto do homem pelo homem, bem pelo contrário: mais do que nunca se disputam as fronteiras entre o original e o plágio, e o autor é elevado, protegido e consagrado como instituição. Por isso é tão difícil, por ser tantas vezes tomado por ofensa, como se a macu

Javier Marías e a arte como "forma de pensamento"

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Javier Marías, reputado escritor espanhol, define a literatura como uma forma de pensamento. Vale a pena transcrever todo esse parágrafo:   “La literatura es también una forma de pensamiento, y una de las principales, y no creo que a eso pueda renunciar el mundo, sobre todo porque ese pensar literario -en forma de narraciones o historias o de versos o de diálogos y monólogos- nos viene acompañando desde hace demasiados siglos. Hay cosas que sabemos sólo porque la literatura nos las ha mostrado, o nos ha permitido tomar conciencia de ellas y reconocerlas. Hay saberes e intuiciones que no son expresables o no se manifiestan en un lenguaje exclusivamente racional: ni técnico, ni filosófico, ni económico, ni religioso, ni científico, ni desde luego político, ni tan siquiera psicológico.”   Não podia estar mais de acordo. Aliás, acrescentaria que toda a forma de arte é uma forma de pensamento; que toda a arte é o resultado de uma atitude filosófica, de um colocar em movimento e obra
Para quê construir cidades mágicas, Arcadas, catedrais estrondosas, Para pessoas cruéis Neros capazes de incendiar a sua própria casa Ou contar estórias edificantes e transformadoras Para brutos orgulhosos da sua barbárie Que chupam a gordura dos dedos E batem nas suas companheiras Para quê afinal toda essa abnegação à arte Pela arte À civilização, à humanidade, Para vir um bêbado e destruir tudo com as patas? O mundo é uma coisa demasiadamente frágil Para as crianças andarem a brincar com fósforos No palheiro.

O proletariado e a luta contra o trabalho como fonte de toda a exploração

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  As camadas da classe trabalhadora que mais lutam pela progressão da sua condição laboral são aquelas que mais impregnadas estão pela ideologia do trabalho . Até neste aspeto o proletariado apresenta uma situação distinta. O seu trabalho é só um trabalho, é só uma forma de garantirem a sua reprodução social através do salário. Não será então por acaso que as classes profissionais que mais lutam pela conservação do seu trabalho e correspondente dignificação sejam as classes profissionais mais valorizadas social e economicamente. Neste aspeto a relação do proletariado com o trabalho é menos sentimental e mais pragmática; o trabalho que realizam nunca é o trabalho da sua vida e, muito menos, uma missão. Nesta lógica precisa o proletariado, uma vez mais, está muito mais apto a apresentar motivações revolucionárias do que a “aristocracia laboral”. Os proletários não têm tanto de “salvar os seus empregos” do que garantir o pão na mesa seja em que emprego for. A medida com que os proletári